EDINHO ARAÚJO*
O ano de 2014 começa sem o jornalista e advogado Alcides Silva, amigo e inspirador. Nascido de Dora e Duarte, casou-se com Eliza. Plantou árvores, escreveu versos, constituiu família. Teve filhos, conheceu netos e bisnetos. Viveu intensamente.
Parte o homem, fica sua história. E ela tem tudo a ver com Santa Fé do Sul, cidade que amou intensamente por quase 55 anos. Um caso de amor que o levou a recusar convite para integrar minha equipe de trabalho, quando, em 1982, elegi-me deputado estadual por São Paulo:
– Ir pra São Paulo? Nem pensar. Não deixo Santa Fé do Sul por nada…
Singular jurista na área do Direito Público, Alcides Silva foi meu mestre, braço direito nos quase seis anos em que administrei Santa Fé do Sul (1977/82). E emprestou seus conhecimentos a inúmeras prefeituras e câmaras municipais de cidades de São Paulo e Mato Grosso do Sul.
Recém-chegado aqui na barranca do rio Paraná, em 1959, Alcides acompanhou de perto a revolta do arranca-capim, conflito agrário entre arrendatários de terras e o fazendeiro Zico Diniz, que envolveu cerca de cinco mil pessoas. Para media-lo veio de São Paulo o zoólogo Paulo Vanzolini, um dos grandes nomes da música brasileira, que aqui juntou-se ao agrônomo Lourival Pires Fraga. Vanzolini e Alcides engataram amizade duradoura.
O jornalista testemunhou o alagamento de terras férteis, tomadas pela água represada para mover a usina de Ilha Solteira. Viu submergir a antiga Rubinéia, cidadezinha amada pelos poetas de alhures, como Carlos Drummond de Andrade, e os de casa, representados por Osmar Novaes, grande homem público e seresteiro por paixão.
Acompanhou a saga de Aparecidão, o líder messiânico preso em manicômio pela ditadura, e libertado após intensa pressão de entidades ligadas aos direitos humanos. Alcides Silva à frente, com Eduardo Teixeira Brancato, Roberto Rollemberg, Laurindo Novaes Neto e tantos mais…
Foi ao meu lado um ardoroso defensor da ponte Rodoferroviária. Alcides pode festejar o fim da travessia por balsas entre São Paulo e Mato Grosso do Sul, quando finalmente a ponte entre Rubineia e Aparecida do Taboado foi entregue em 1998. E viveu para ver a Euclides da Cunha duplicada. Batalhas vencidas.
Recordo-me que a quatro mãos redigimos meu primeiro pronunciamento na Assembleia Legislativa de São Paulo (1982):
“Venho de uma cidade cujos telhados vermelhos indicam que agora é que se está começando a sua história, agora é que vai se formando a sua tradição (…) Venho dos longes. Venho da terra nova, quente ainda das coivaradas da última derrubada…”
Alcides Silva deixa o legado de um homem apaixonado pelo jornalismo, a literatura e o direito, mas, sobretudo, por esta cidade que ele adotou. Sua coluna “Inculta e Bela”, uma referência em “O Jornal”, fará falta.
Lá se foi o poeta, o filho querido, o pai amantíssimo. Lá se foi para continuar cantando a vida, em outras nuvens, em outras estrelas, junto a outros homens bons.
- * Edinho Araújo é deputado federal pelo PMDB e ex-prefeito de Santa Fé do Sul